Seleção Que Gosto de Ver ao longo da vida

Quanto valem o passado e o futuro ao longo da vida?

Investimentos, números e gráficos são apenas uma pequena parte da avaliação de finanças pessoais. Por isso, estamos sempre procurando entender melhor os processos que levam as pessoas a tomar suas decisões. Gostaríamos de compartilhar com vocês alguns dos trechos interessantes que surgem durante esse estudo.

O ciclo da vida, em muitos aspectos, descreve uma arco de desenvolvimento, auge e declínio. Em cada uma dessas etapas, diversas características biológicas, psicológicas, sociológicas, antropológicas e outras tantas “-lógicas” influenciam as suas decisões.

Eduardo Giannetti1 reflete de maneira brilhante sobre alguns aspectos que parecem óbvios  depois da leitura, sobre os quais raramente paramos para pensar.


Infância

O recém-nascido, apesar de ter toda a vida pela frente, não compreende as escolhas de que dispõe. O bebê age então pelo instinto imediato. Ele chora pelo que quer agora, normalmente necessidades fisiológicas. A criancinha não chora por que quer um ensino superior de qualidade, um emprego com horas flexíveis ou uma aposentadoria confortável.

Ironicamente, esse comportamento volta a vigorar quando o homem está bem próximo do final da vida. O moribundo em seu leito de morte abandona qualquer perspectiva futura e passa a viver apenas mais um dia de cada vez. Em ambos os casos, o passado e o futuro não importam, apenas o presente é relevante.


O jovem enxerga a vida como um vasto campo de oportunidades, e cria a confiança de que o futuro será próspero

Nesse desconto, o crédito é o instrumento da antecipação, e os juros são o preço a ser pago. O jovem quer antecipar para hoje um pouco da riqueza de seu futuro próspero.

O problema não está em antecipar o futuro, tampouco nos custos envolvidos. O problema está nas premissas do futuro próspero e brilhante, que o jovem muitas vezes dá como certo. A combinação de impulsividade com uma previsão otimista podem trazer um preço caro demais.


O recém-nascido não chora por querer um ensino superior de qualidade 

A criança, porém, em algum momento começa a compreender o conceito de futuro. Com isso, ela começa a desenvolver um sistema de tomada de decisões intertemporais (sobre as quais escrevi mês passado, no artigo Raízes biológicas dos juros). 

Existe um experimento clássico, já repetido diversas vezes com algumas variações, para tentar identificar a etapa da vida em que a capacidade de avaliação das trocas intertemporais se desenvolve.

Nesse estudo, uma criança é deixada na sala com um doce. Um adulto explica que ela pode comer o doce a qualquer momento, se quiser. Mas, se ela puder esperar 20 minutos, o adulto retornará e lhe dará mais um doce e ela poderá comer os dois.

A criança é confrontada com um dilema claro: comer um doce agora ou dois doces daqui a 20 minutos. O resultado depende de dois fatores: o apelo da recompensa futura e a capacidade de esperar, que decorre da força de vontade da criança.



Encarada do ponto de vista da juventude, a vida é um futuro indefinidamente longo, ao passo que na velhice ela parece um passado deveras curto. (…) Um homem precisa ter envelhecido e vivido bastante para perceber quão curta é a vida.

O jovem entende que seus atos influenciam o futuro e que as trocas intertemporais são poderosas, mas a vida ainda lhe parece um vasto campo de oportunidades. Ele ainda não experimentou nenhum revés significativo e tende a superestimar a sua capacidade, desprezando os riscos inerentes à vida. Há grande expectativa de sucesso e isso gera uma alta propensão a descontar o futuro para maximizar o aproveitamento do presente.


Maturidade

A maturidade ocupa uma posição equidistante entre a juventude e a velhice. Com ela três efeitos são percebidos: (i) uma perspectiva menos assimétrica entre passado e futuro; (ii) uma antevisão menos sonhadora e mais realista do futuro; e (iii) uma maior capacidade de articular a interrelação entre os momentos da vida, em vez de encará-los como etapas isoladas.

Há uma gradual redução da impulsividade e da impaciência, e maior preocupação com o futuro, relativizando as demandas do presente. O adulto já sofreu e compreende os revéses que a vida nos impõe e sabe que as suas expectativas nem sempre se concretizam.

O homem maduro se dá conta de que a velhice é inexorável e, se possui dependentes, passa a dar a devida importância ao amanhã. A maturidade reduz o impulso de descontar o futuro e cria a propensão a tentar inverter essa equação e poupar.




Algumas versões mais antigas deste teste foram feitas há várias décadas e o mais interessante é que alguns continuaram acompanhando o desenvolvimento das crianças até a idade adulta. Com isso, perceberam que as histórias de sucesso acadêmico e profissional eram mais frequentes entre as pessoas cuja habilidade de avaliar trocas intertemporais se desenvolveu mais cedo. Também apresentaram menores índices de tabagismo e de uso de drogas e menores índices de delinquência e conflitos familiares graves.

Os resultados são compreensíveis. Um dos primeiros trade-offs que a criança encontra em sua vida é na alocação de tempo entre brincadeiras e estudos. A criança com mais capacidade de avaliar o benefício distante e incerto dos estudos tem maior propensão a dedicar-se a eles. Também o jovem que consegue perceber os malefícios de longo prazo do cigarro tem mais convicção para resistir à pressão dos colegas.



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